terça-feira, 29 de março de 2011 às 13:03
Atrás dos muros de Tucum histórias de dor e esperança





José Rabelo


(“Nossa geração não lamenta tanto os crimes dos perversos quanto o estarrecedor silêncio dos bondosos”. Martin Luther King)


Rebeliões constantes e sangrentas que deixam um rastro de mortes e de terror; fugas facilitadas por policiais corruptos que também são responsáveis pela entrada de celulares, drogas e armas nas prisões; detentos comandando o crime organizado de dentro das cadeias; superlotação, falta de dignidade e desrespeito aos direitos humanos. Esses são só alguns dos problemas que já se tornaram corriqueiros no sistema prisional brasileiro. A situação crônica mobiliza organizações nacionais e internacionais preocupadas com esses verdadeiros “depósitos de gente” que, a cada dia, estão mais distantes de seu objetivo principal e final: recuperar essas pessoas para que elas possam ser de fato ressocializadas. Embora esse seja um câncer social que, de maneira direta ou indireta, espalha suas ramificações para toda a sociedade, grande parte das pessoas prefere se afastar do problema e simplesmente empurrá-lo para debaixo do tapete. Por sorte, uma minoria valente prefere encarar o desafio e dar sua contribuição para tentar transformar o caos em esperança de vida para quem está lá dentro e também para nós que estamos aqui fora.


Cristal Carvalho, proprietária da Cristal Produções, faz parte dessa minoria valente. Há cerca de quatro anos ela foi convidada pela Secretaria de Estado da Justiça (Sejus) para produzir um vídeo que mostrasse às ações de ressocialização que eram promovidas dentro das penitenciárias capixabas. “Em princípio, confesso que o tema não tinha muito a ver com o trabalho da produtora. Mas quis conhecer de perto a realidade do sistema prisional para avaliar melhor a proposta”. Embora os amigos e familiares pedissem para que ela não se metesse com isso. Cristal foi buscar fibra e determinação no seu sangue nordestino – ela nasceu em Fortaleza, Ceará – para aceitar a empreitada. Percorreu quase todas as penitenciárias masculinas e femininas da Grande Vitória fazendo anotações e colhendo depoimentos. O resultado foi uma série de reportagens especiais que foram veiculadas no programa ‘Bem Viver’, (da GTV - canal 14), que é feito pela sua produtora. Essa primeira experiência fez crescer o interesse de Cristal pelo tema, principalmente quando ela soube que o número de mulheres envolvidas com a criminalidade crescia assustadoramente no Estado. “Esse dado me preocupou bastante. Então decidi que faríamos um documentário sobre esse tema”. No final do ano passado, durante o planejamento estratégico da produtora, Cristal fez questão de incluir no plano a produção de um institucional que fosse feito integralmente com recursos da produtora. Estava sendo escrita a primeira linha do roteiro de “Tucum: de um extremo ao outro”. Com 22 minutos de duração o documentário mostra o depoimento de 14 mulheres – uma delas já em liberdade – do Presídio Feminino de Tucum, em Cariacica. Desde que passou a ser exibido em mostras de vídeo e universidades, o documentário tem sido alvo de discussões acaloradas de pessoas que estão procurando soluções para o sistema prisional feminino. “Parece que o vídeo tem provocado bastante as pessoas. A intenção era justamente essa, levar o problema à tona para ser discutido na sociedade”.


Cristal Carvalho é especializada em comunicação empresarial. Começou a carreira na TV Minas, em Belo Horizonte. No Espírito Santo chegou há 21 anos para trabalhar na TV Vitória, onde ficou por 15 anos. Foi uma das idealizadoras do programa “Vivendo Melhor”. No entanto, o estresse causado pela grande demanda de trabalho fez com que Cristal procurasse um outro espaço profissional. Logo que a TV Gazeta lançou o Canal 14 (GTV), Cristal foi convidada para integrar a equipe. O programa, que continua no ar até hoje na GTV, mudou o nome de “Vivendo Melhor” para “Bem Viver”. O formato do programa também foi ampliado. Menos de dois anos depois ela montou a Cristal Produções e hoje, além do “Bem Viver”, produz vídeos empresariais e institucionais para diversos clientes.


- Século Diário: Como surgiu a idéia de fazer o documentário “Tucum: de um extremo ao outro”?



Foto: José Rabelo
  
- Cristal Carvalho: O programa ‘Bem Viver’ tem uma parceria com o Movimento Capixaba de Voluntariado em um projeto chamado ‘Mão Solidária do Voluntariado’, que inclusive neste ano entre na sua quarta edição. Há cerca de quatro anos, logo quando abrimos a produtora, a Maria José, do Movimento de Voluntariado, disse-me que havia uma demanda da Secretaria da Justiça (Sejus) para produzir algo a respeito do sistema prisional no Espírito Santo. Em princípio, confesso que esse tema não tinha muito a ver com o trabalho da produtora. Porém, quis conhecer de perto a realidade do sistema prisional para avaliar melhor a proposta. Fiz então uma peregrinação por quase todos os presídios capixabas (masculinos e femininos) da Grande Vitória. A Sejus queria que produzíssemos um vídeo que desse maior visibilidade aos projetos de ressocialização. Mas eu queria saber primeiro quem era esse público e como eles estavam vivendo.


- E o que a senhora constatou durante essas visitas?


- Procurei anotar tudo que vi. Além disso, fiz uma série de perguntas aos presos. Por exemplo, no Presídio de Segurança Média de Viana conversei com um detento já bem ‘senhorzinho’ que estava costurando uma bola. Ele me disse com satisfação que era o seu primeiro dia de trabalho. E ressaltou que o pior da prisão era a ociosidade. Foram a partir de depoimentos como esse que eu percebi a importância de se fazer um trabalho que pudesse sensibilizar a sociedade sobre a dura realidade do sistema prisional e que era preciso criar condições para que essas pessoas de fato possam se reintegrar à sociedade. Saí de lá e escrevi o projeto ‘Recuperando Vidas’, em parceria com a Sejus. Eu percebi o quanto as ações de ressocialização eram importantes para dar visibilidade ao outro lado da vida dessas pessoas.


- E como vocês trabalharam o conteúdo desse primeiro material?


- Nós fizemos uma série de reportagens especiais que foram veiculadas no programa ‘Bem Viver’. Mostrávamos nessas reportagens ações de ressocialização que aconteciam nos presídios masculinos e femininos e estavam dando resultados. Uma ocasião nós convidamos para um café-da-manhã as principais autoridades do Estado que estavam envolvidos de forma direta ou indireta com a questão. Chamamos juízes, promotores, secretários de governo, empresários e formadores de opinião para assistirem a um vídeo que produzimos especialmente para o encontro. Nossa intenção era sensibilizar essas pessoas que têm funções estratégicas nas decisões relacionadas ao sistema prisional e provocar a discussão. A partir daí, continuamos buscando novas oportunidades, sempre que era possível, para levar o debate à sociedade.



Foto: Divulgação/Cristal Produções
  
Interna no Presídio de Tucum
- Essas experiências foram amadurecendo a idéia de fazer o documentário de Tucum?


- Sim. No final do ano passado, quando estávamos fechando o planejamento estratégico da produtora para 2007, fiz questão de incluir no plano a produção de um institucional que fosse feito integralmente com recursos nossos. Eu havia acabado de saber que o índice de criminalidade entre as mulheres estava aumentado consideravelmente no Espírito Santo. Esse dado me preocupou bastante. Então decidi que faríamos o documentário sobre esse tema. A equipe, num primeiro momento, foi contrária a idéia. Eles achavam arriscado filmar dentro de um presídio. Mas acabei convencendo a equipe a aceitar o desafio. Quando comecei a montar a história, a primeira pessoa que me veio à cabeça foi a Miriene Soares. Na época em que estávamos fazendo o ‘Resgatando Vidas’, o Tribunal de Justiça lançou o programa ‘Recomeçar’. E a Miriene, que ganhara a liberdade havia três meses, foi beneficiado pelo programa. Ela recebeu a oportunidade de trabalhar na Rede Gazeta, que aderiu ao programa. Eu fiz questão de incluir o relato de Miriene – das mulheres do documentário, a única que está fora do sistema prisional – pelo fato da história dela ter dado certo. Atualmente, ela é chefe de serviços gerais na Gazeta. Quando a entrevistei eu olhava para ela e começava a chorar. E ela continuava firme respondendo às perguntas. Eu tentava imaginar o que aquela mulher havia passado na penitenciária. Ela me dizia: ‘Eu estou aqui trabalhando e meus filhos agora podem contar comigo’. Isso me tocou bastante porque era um depoimento muito forte, muito sincero. Você percebia que a vida dela estava se desabrochando novamente. Por isso, o título do documentário é esse – ‘Tucum: de um extremo ao outro’ -, porque essa era a maneira de mostrarmos que havia duas vertentes. A história de Miriene passou a ser um incentivo para as outras detentas, porque prova que a mudança é possível. Em seguida, montamos o projeto e apresentamos à Sejus para recebermos a autorização para gravar o documentário. Para minha surpresa não houve dificuldades para a secretaria liberar as filmagens. O secretário da Sejus, Ângelo Roncalli, disse que era preciso mesmo mostrar essa realidade à sociedade.



Foto: José Rabelo
  
- Por que a senhora escolheu as mulheres?


- Quase 90% das mulheres que cumprem pena são mães. Se essa mulher é ressocializada ela leva consigo a família. No entanto, no caso de reincidência, ela também vai acabar tornando seus familiares, principalmente seus filhos, mais vulneráveis à criminalidade. A realidade da mulher é muito diferente à do homem. Quando a mulher é presa, os maridos, na sua grande maioria, não visitam as esposas. Os homens, e praticamente toda a sua família, abandonam as mulher na prisão. A mulher não. Ela se mantém firme, dando total apoio ao companheiro que se encontra preso. Por isso, a ressocialização entre as mulheres se torna fundamental. As pessoas precisam olhar para essa situação como um problema social. Porque, se não fizermos nada para reverter esse problema, todos nós continuaremos sendo reféns da violência que é maior a cada dia. 

- Antes de iniciar a gravação do documentário houve algum trabalho de aproximação para conquistar a confiança das presidiárias? 


- Na verdade não houve esse processo de aproximação. Em três oportunidades, com a ajuda das assistentes sociais de Tucum, nós selecionamos 20 mulheres. O convite para participar do documentário, obviamente, era espontâneo. Explicávamos qual era a proposta e aquelas que concordavam assinavam um termo de direito de imagem. Das 20 selecionadas, 15 concordaram em participar do vídeo. Nós procuramos selecionar mulheres com perfis bem diversos. Desde uma que havia se envolvido no tráfico de droga – o que é mais comum -, até uma que havia cometido um crime hediondo. O objetivo era justamente mostrar histórias de vida bem distintas. Na verdade, pensei em levar as fichas para saber quem eu estava entrevistando durante as gravações. Mas na hora acabei esquecendo, o que no final foi muito bom, porque eu não sabia com quem eu estava falando. Isso deu mais imparcialidade aos depoimentos, pois não houve nenhum pré-julgamento da minha parte. Dessas quinze que concordaram, apenas uma desistiu no último momento. Agora, é preciso fazer uma ressalva. As mulheres que participaram do documentário não foram, em momento algum, arredias às perguntas. Elas entenderam o vídeo como uma oportunidade para elas darem visibilidade às suas demandas. Por isso os depoimentos foram tão reais e comoventes.



Foto: José Rabelo
  
- A senhora passou por alguma situação de tensão durante as gravações?


- O secretário (Ângelo Roncalli) me preveniu. Pediu que eu tivesse cuidado, que não me aproximasse muito delas. Entretanto, não houve nenhum problema comigo ou com a equipe. Inclusive, meus dois filhos ajudaram na produção. Foi tudo muito tranqüilo. Elas têm uma carência muito grande de conversar, de trocar. Quase todas choraram durante os depoimentos.


- O documentário foi filmado em um único dia, não foi isso?


- Exatamente. Filmamos pouco mais de cinco horas, entre imagens brutas e depoimentos. Depois editamos 22 minutos para o documentário.


- Foi difícil para escolher o que ficaria de fora do documentário?


- Essa foi a parte mais difícil. Havia muita coisa interessante. Na edição acabei deixando de fora, por exemplo, uma parte do depoimento da Miriene. Nesse trecho a Miriene diz que a época que ela mais usou droga foi justamente no presídio. Ela já era usuária antes de ser presa, mas ela afirma que depois que foi presa passou a ser uma ‘usuária voraz’ de drogas pesadas.


- A senhora tirou esse trecho para preservar a Miriene?


- Realmente eu não sei. Só sei que aquilo me incomodou bastante.


- Mas a idéia não era mostrar a realidade?


- Sim, claro. Ela mesma me disse: ‘Não me pergunte como, mas eu quase morri por causa das drogas aqui na prisão’. Mas o fato é que acabei tirando.


- Após essa última exibição (9/11) do documentário no Cine Metropolis (Ufes), houve uma mesa redonda para debater o tema “Criminalidade Feminina”. Quais são as questões que têm aparecido nesses debates?


- Esse último debate no Metropolis foi fantástico. Participaram da mesa a procuradora de justiça, Catarina Cecin Gazele; a defensora pública geral do Estado, Elizabeth Hadad; a deputada Luzia Toledo, representando a Assembléia Legislativa; José Darcy Arruda, chefe dos delegados de polícia; a Miriene, além da diretora do presídio de Tucum, Maria Aparecida de Azevedo e a da diretora de Ressocialização, Quésia Cunha. Aproveitei que todas essas autoridades estavam presentes para dizer que se o documentário não repercutisse mais nada dali para frente eu a já estava satisfeita. Disse o seguinte: ‘Eu posso querer muito ajudar aquelas mulheres, mas posso fazer muito pouco. Agora, vocês sim têm muito a fazer para transformar efetivamente a vida dessas mulheres’. Por exemplo, a defensoria tem pessoal de menos para atender esse público; o Ministério Público é moroso para julgar esses processos, e por aí vai. Eu percebi que após a apresentação do documentário os participantes da mesa demonstraram estar sensibilizados e, de certa forma, incomodados com o que viram. A procuradora Catarina disse que se sentia no dever de fazer alguma coisa para melhorar a situação dessas mulheres. A deputada Luzia Toledo declarou que passaria o fim de semana todo pensando em soluções. Enfim, parece que o vídeo provocou bastante as pessoas. A intenção era justamente essa.


- Sua visão sobre o sistema prisional mudou antes e depois do documentário?


- Eu não diria que mudou, mas que se intensificou. Por exemplo, essa questão da maternidade eu só fui perceber a dimensão depois que tomei conhecimento das histórias de vida dessas mulheres e entendi o quanto que o futuro de seus filhos depende de um processo de ressocialização positivo. É como eu disse, se a ressocialização não funciona a probabilidade dessas crianças caírem na criminalidade é muito grande. Agora, é importante frisar que a pessoa que cometeu um delito tem de ser punida. Entretanto, a pessoa tem o direito de pagar seu erro com dignidade. Sem dignidade não há recuperação.


- Embora a senhora não seja especialista em segurança pública, a que a senhora atribui o aumento da criminalidade entre as mulheres?


- Acredito que seja a falta de oportunidades de toda ordem aliada ao apelo da sociedade de consumo, que cada vez mais incita o consumismo desenfreado, levando as pessoas a fazerem qualquer coisa para obter um bem. Acho que esse é o problema central. Há um outro fator importante. Geralmente, a mulher tem um papel coadjuvante no crime. Poucas são as mulheres que protagonizam os crimes. Pesa bastante também a cumplicidade amorosa com o parceiro. Normalmente, o homem acaba levando a mulher à criminalidade. E, muitas vezes, elas passam a praticar delitos até ingenuamente. Dos 14 depoimentos, nove mulheres disseram que entraram para o crime por influência do companheiro.


- O que mais lhe chamou atenção nos depoimentos?


- O fato de a maioria ser mãe me tocou bastante. Mas eu também olhava para elas e me perguntava: Será que essa pessoa teve oportunidade de estudar, de ter um trabalho. Quando se está ali, frente a frente com elas, você percebe que aquele é um retrato triste do Brasil. É o Brasil da falta de oportunidades. Isso me sensibilizou muito, porque você fica pensando que as coisas poderiam ser diferentes.


- Quando essas mulheres retomam a liberdade, qual é o maior desafio para elas?


- A Miriene, por exemplo, me disse que seu maior desafio foi o medo de sofrer rejeição, não só por parte da família, mas também da sociedade de maneira geral. Essa sensação de medo é muito forte. Em alguns casos ela acaba ‘paralisando’ a pessoa e impedindo que ela prossiga nesse processo de ressocialização. Se a pessoa não tiver muita força interna ela não avança. A Miriene tem uma força de vontade incrível e uma auto-estima muito grande. Acho que isso a ajudou bastante.


- As mulheres que cumprem pena, a exemplo dos homens, também têm suas próprias regras dentro da prisão. Em Tucum essas regras são muito rígidas?


- Há as regras do próprio presídio e as regras das internas, que normalmente são mais severas que as do presídio. Elas dizem que quando chegam ao presídio sofrem muita pressão. A situação se torna mais tensa para as que cometeram crimes hediondos de repercussão pública. Por exemplo, aquela moça que está sendo acusada de participar do assassinato daqueles dois garotos que andavam de bicicleta e foram cruelmente assassinados em Vila Velha, até concordou em fazer o depoimento, mas ela não pôde sair ‘do seguro’ para falar conosco. Se ela sair de lá é morte na certa. Crimes hediondos principalmente contra crianças não são tolerados. Toda cela tem uma liderança que determina as regras ali dentro. Quem fere o código sofre punição. Segundo elas, os maiores incidentes acontecem à noite. Como as celas estão superlotadas, muitas vezes, quando uma delas se levanta à noite para ir ao banheiro acaba pisando, sem querer, em uma outra que está deitada. Isso é motivo suficiente para causar uma grande briga. A falta de privacidade causada pela superlotação torna a convivência bem mais difícil. Essa é uma queixa recorrente entre as mulheres.



Foto: Divulgação/Cristal Produções
  
Vista externa do Presídio de Tucum
- Como elas compensam a carência afetiva dentro do presídio? Ouvi dizer que existe uma cela reservada, com o consentimento da direção do presídio, para que elas possam manter relações sexuais entre elas.


- Ninguém comentou sobre essa cela em específico. Eu acho que há relações homossexuais dentro das próprias celas. Nos depoimentos nós escolhemos algumas que são assumidamente homossexuais, com a intenção de garantir a diversidade do documentário. Dá para perceber que a libido ali dentro é exacerbada. Muitas mulheres, diante das circunstancias, da pressão, da carência, acabam tendo relações homossexuais. Isso não quer dizer que quando ela sair dali continuará a ter preferência por mulher. Acho mesmo que é uma situação circunstancial. Nitidamente é possível perceber que algumas mulheres assumem um perfil bem masculinizado. Muitas comentam abertamente que são ‘casadas’. No geral, a carência é muito grande entre elas. Já os homens, ao contrário das mulheres, abandonam suas companheiras no presídio. Poucas presas têm parceiros fixos e recebem visitas íntimas.


- Quais são seus planos para o documentário de agora em diante?


- Estamos recebendo vários convites para exibir o documentário. Inclusive o presidente da CPI do Sistema Carcerário, deputado Neucimar Fraga – que esteve recentemente no Espírito Santo visitando os presídios -, tomou conhecimento do vídeo é quer levá-lo para Brasília. Fiquei um pouco surpresa com a boa repercussão do documentário. Está sendo além do que eu esperava.


Diante do sucesso de “Tucum...” a senhora pretende fazer um novo documentário?


- Com certeza. O tema do próximo documentário deve ser gravidez na adolescência. Inclusive, esse tema faz até um link com ‘Tucum’. Embora eu não esteja necessariamente querendo forçar esse link. Pensei no tema porque a gravidez precoce é um problema social gravíssimo que precisa ser enfrentado.
http://www.seculodiario.com.br/arquivo/2007/novembro/17_18/entrevista/entrevista/17_11_01.asp
às 12:54

Criminalidade feminina no Espírito Santo cresceu 28% em um ano

por Lygia Bellotti, Lyvia Justino e Tatiana Arruda 

Para tentar entender o contexto da violência no universo das mulheres que cometeram crimes, as repórteres Lyvia Justino, Lygia Bellotti e Tatiana Arruda foram ao Presídio Estadual Feminino, em Tucum, e conversaram com a diretora do presídio e com duas mulheres que estão cumprindo pena no local.
Situação atual
O Presídio Estadual Feminino, em Tucum, Cariacica, é o maior presídio feminino do Espírito Santo, com capacidade para 175 presas, mas atualmente abriga 424 detentas. Se comparado ao mesmo período de 2005, o número de detentas em Tucum praticamente dobrou. A rotatividade de mulheres que passam pelo presido também é grande. Por dia entram e saem em torno de dez mulheres.
Segundo a diretora do presídio, Maria Aparecida de Azevedo, cerca de 70% das presas cumpre pena por tráfico de drogas, e 82% delas têm algum envolvimento com outras pessoas que estão presas, como filhos e marido. Maria Aparecida destacou ainda que o maior motivo de envolvimento das mulheres com o crime é resultado da influência masculina. “Elas fazem parte da área periférica do tráfico, e são parceiras ou familiares de de traficantes”.
Projetos de ressocialização
Diversos projetos são desenvolvidos dentro da penitenciária para proporcionar possibilidades mais efetivas de ressocialização e de reintegração com a sociedade. O trabalho na produção de roupas, oferecida por uma fábrica do Estado para as presas, pode reduzir a pena em até um terço.
Outras atividades como festas para comemorar datas como Dia da Mulher, Dia das Crianças e Natal também são realizadas em Tucum. O objetivo, segundo Maria Aparecida, é promover interatividade e melhorar o relacionamento entre as mulheres.
Para Maria Aparecida, estas atividades ajudam a despertar a idéia de que existem possibilidades fora do crime. “Quando a sociedade se dispõe a vir até o presídio e se envolver com as detentas, ela vem trazendo uma visão desprovida de preconceito. E dão a elas oportunidade de ter consciência de que podem sair daqui diferentes, melhores”, ressaltou.
Condenada por assalto à mão armada, Débora Matos, 23 anos, acredita que os projetos de ressocialização desempenhados dentro do presídio ajudam a ocupar o tempo e a mente, além de promoverem a interação entre as detentas. “Participo de todas as atividades que são oferecidas aqui, faço ioga, jogo vôlei, vou às reuniões em grupo. E quando tem alguma festa, eu sempre me divirto, consigo esquecer por um instante que estou presa”. Debora afirmou também que as atividades favorecem a harmonia entre as internas.
às 12:29

Detentas do presídio feminino de Taubaté-SP


DETENTAS DO PRESÍDIO FEMININO DE TAUBATÉ, FALAM DA DOR E TRISTEZA COM A SEPARAÇÃO DE SEUS BEBÊS.

A inocência perdida desde cedo, a escolha do caminho errado e o acerto de contas com a Justiça. As realidades que resumem a história de vida das mulheres que hoje cumprem pena na Penitenciária Feminina de Taubaté, não refletem o maior sofrimento vivido pelas detentas: a separação dos filhos que são concebidos dentro da prisão.

Nos últimos seis meses, 25 grávidas estiveram presas na penitenciária. Essas detentas se transformaram em "mães do cárcere" - como são conhecidas as mulheres que permanecem presas durante todo o período de gestação - e as outras cinco conseguiram ganhar a liberdade antes de entrar em trabalho de parto.

O pequeno A., por exemplo, completa três meses de vida na semana que vem. Noventa dias vividos atrás das grades. O menino é o primeiro filho de Viviana Madalena da Silva, 22 anos, que cumpre pena há 11 meses por tráfico de drogas. A detenta, que deverá ficar presa mais quatro anos em regime fechado, tentou entrar com drogas na Penitenciária de São Vicente. “Fui flagrada pela revista e presa em flagrante.”

O bebê de Viviana é criado numa unidade carcerária especial, própria para a presa que acabou de dar à luz. Porém, o convívio com a mãe detenta não vai durar muito. Pela Lei de Execução Penal, as crianças podem ficar na penitenciária por, no máximo, seis meses, período em que o aleitamento materno deve ser alimentação exclusiva.


"Se ele pudesse ficar comigo seria melhor, mas sei que não dá. Vou ter que me separar mesmo", resigna-se Viviana, com o bebê no colo. Terminado o prazo, o serviço social da penitenciária entra em contato com as famílias das detentas para avaliar a possibilidade de a criança ficar com um parente. Quando isso não é possível por falta de condições financeiras, os bebês são encaminhados para instituições de amparo que as abrigam até a liberdade das mães.

BERÇÁRIO

Apenas quatro presas que deram à luz recentemente continuam amamentando seus bebês. Há uma semana A. ganhou a companhia de P. O recém-nascido é filho de J.D.A., 24 anos. A detenta foi presa assim que engravidou, há nove meses, pelo mesmo crime - tráfico de drogas - que levou à prisão 90% das mulheres que cumprem pena em Taubaté. "Meu trabalho era conseguir vender o máximo de drogas possível, conseguindo novos compradores e aumentar o lucro do traficante para o qual trabalhava", relatou J.

O número de bebês na Colméia, porém, aumentará nos próximos dias. A detenta R.V.A., 24, está grávida de nove meses. A jovem foi presa também por participar de uma das quadrilhas especializadas no tráfico de drogas que atua em Campinas.

"Hoje me arrependo do que fiz no passado. Quando meu filho completar seis meses irá morar com minha mãe", disse, revelando que o pai da criança também está preso no Complexo Penitenciário de Hortolândia. "Ele cumpre pena por assassinato", relatou.

As detentas em período de gestação, que cumprem penas superiores há um ano e, que, conseqüentemente terão seus bebês na cadeia, recebem apoio do GDF. Uma parceria firmada entre as secretarias de Segurança Pública e de Saúde, além do Ministério da Saúde, viabilizou a formação de uma equipe que atua dentro do presídio.

De acordo com a diretora do presídio, as detentas têm direito a um acompanhamento médico completo que inclui exames ginecológicos, clínica geral e atendimento odontológico. "As presas também participam de palestras que previnem o câncer de mama e a Aids. Até distribuímos camisinhas e pílulas anticoncepcionais", explica a diretora.

Quando as detentas precisam fazer exames laboratoriais, uma escolta policial as acompanha até os hospitais onde são feitos os exames. O mesmo procedimento é feito quando um dos bebês precisa passar por exames.

"As crianças que nascem aqui recebem os mesmos cuidados que qualquer outra. Elas saem da cadeia até para fazer o exame do pezinho", conta a diretora do presídio.
às 11:55

Apenadas fazem prova do ENEM no Presídio Feminino

Segunda-Feira , 04 de Janeiro de 2010 - 13:22

A SEJUS – Secretaria de Estado De Justiça informa que nesta terça e quarta-feira, 5 e 6 de janeiro, haverá a prova do ENEM -Exame Nacional do Ensino Médio - para 16 apenadas do Presídio Feminino.
Durante este período, presidiários estudantes do ensino médio, em todo o país farão prova do Enem, e terão a oportunidade de concorrer a vagas nas universidades brasileiras que aceitam a pontuação do exame como critério de entrada. Apesar de pouco divulgado, a educação é um direito dos apenados.
De acordo com a legislação, os apenados têm o direito de freqüentar cursos de educação formal, isto é, de ensino básico, fundamental e médio, nos próprios presídios ou em escolas normais. "A Lei das Execuções Penais, nº 7.210, de 11 de julho de 1984, estabelece o direito à assistência educacional, em seus arts. 17 a 21. A Lei disciplina que o ensino de 1º grau é obrigatório e as atividades educacionais podem ser objeto de convênio com entidades públicas ou particulares. Os presidiários também podem se matricular nas universidades e institutos federais, e cursar cursos de ensino superior nas mesmas.
O apenado em regime semi-aberto pode participar de processo seletivo, com autorização do Juiz da Execução Penal. No caso do Enem, por questões de logística e segurança, o exame se dará nos presídios onde houver alunos inscritos, desobrigando o apenado a pedir autorização judicial para a saída temporária com este fim.
As provas aplicadas serão encaminhadas para classificação e correção a Brasília.
às 11:51

Crianças x Presídio: uma combinação que não dá certo!

Acabo de ver uma reportagem no Jornal do Almoço sobre um tema que já havia me chamado atenção ao ser retratado na novela Cama de Gato, que terminou recentemente, na rede Globo: o caso das detentas que tem filhos na prisão.
Uma das coisas que mais me chama atenção nesse caso é, por que deixar as presas ficarem grávidas dentro do presídio?
Ora, nunca vi um país como o Brasil. Tudo bem que já estamos cansados de saber que aqui tudo acaba em pizza, mas quando chegará o dia em que os bandidos terão menos direitos do que os cidadãos de bem?
A detenta na reportagem que acabo de assistir fala porque acha que as crianças devem ficar até os sete anos (sim, você não leu errado, a justiça brasileira diz que as crianças podem ficar de seis meses a sete anos) com a mãe dentro do presídio:
Fonte: http://www.portalmogiguacu.com.br/paginas.php?id=1824
- Tudo bem que fizemos coisas erradas, mas eu tenho outros filhos e o menor não me chama de mãe porque não pôde ficar comigo aqui dentro. Pelo menos ficando aqui eles sabem que tentamos fazer algo por eles. Não poder ficar com um filho é muita dor.
Sinceramente, será que sou a única a pensar que cadeia nao é lugar para uma criança? Um ambiente cercado por pessoas perigosas, que cometeram os mais variados crimes não pode ser ideal para ninguém.
Está certo, não sou mãe, mas acredito que se fosse mãe e presidiária, preferiria mil vezes que meu filho fosse criado por alguém da minha família ou através da adoção do que convivesse comigo num cenário como esse.
Digo isso também considerando o fato de conhecer várias mães da minha idade, inclusive a minha própria mãe, e saber que nenhuma delas optaria por deixar um filho sofrendo dentro de uma cadeia, onde é privado do convívio de outras crianças e de uma vida livre e sadia.
Não há outra palavra para mim nesse caso a não ser egoísmo.
Fonte: http://webevangelista.blogspot.com/2009/09/uma-triste-realidadecriancas-na-prisao.html
Quer dizer que eu cometo um crime, prejudico pessoas, e ainda me acho no direito de prender uma criança junto a mim só para me satisfazer?
Pensasse nisso antes de cometer um crime!
Sei que é uma forma dura de pensar, mas realmente acredito ser uma crueldade deixar uma criança presa em uma cadeia. Imagina o trauma desse ser indefeso quando se tornar adulto!
Como será a cabeça de uma criança que passou anos de sua infância trancafiado em um presídio? Não entendo como isso pode ser saudável. Não entendo o que de bom uma criança pode aprender num ambiente como esse!
O mínimo que o Brasil deveria ter era uma forma eficiente de contracepção de presas. Poxa, uma injeção, que é um método super eficiente, pode ser aplicada a cada três meses e evitaria situações como essa.
Mas eles não podem dar a injeção, sabe por que? Porque se a presa não quiser tomar, eles não podem forçar! É, realmente, os direitos humanos existem bem mais para os bandidos.
Por acaso alguém se perguntou se uma criança pudesse escolher, ela gostaria de nascer e morar em um presídio? Por acaso alguém nos perguntou se queremos ser assaltados sem poder reagir? Por acaso alguém perguntou se uma pessoa de bem gosta de ter roubado algo que demorou anos para conquistar?
Não, ninguém! E sabe por que? Porque no Brasil o que realmente importa são os direitos humanos dos bandidos. Enquanto isso, continuaremos presos, atrás das grades de proteção das nossas casas, sem que a nossa opinião e vontade valha, absolutamente, nada!
às 11:36

Presídio Regional: Apesar de proibido, bebê ocupava cela


Terça-feira, 20 de julho de 2010
Presídio Regional: Apesar de proibido, bebê ocupava cela
O juiz corregedor do Presídio Regional de Tubarão, Elliston Canali, quer saber por que a administração da unidade carcerária manteve por um mês e meio um bebê junto com a mãe detenta. A criança estava no sistema carcerário desde o nascimento. O bebê, hoje com cinco meses, ocupava uma cela de dois metros quadrados, sob os cuidados da genitora.

“Enviei um ofício assim que soube do caso para que me explicassem porque essa criança estava ali, pois já havia determinado que nenhum bebê poderia ser mantido no presídio de Tubarão”, reforça o juiz. Ele ainda aguarda uma resposta para tomar providências quanto ao assunto.

Em fevereiro deste ano, o corregedor pediu um acompanhamento preventivo à administração do presídio quanto às presas gestantes, para que fossem encaminhadas a outras unidade do estado, que oferecessem condições adequadas de abrigar uma criança.

A lei 335/95 é clara: todo presídio que abriga mulheres precisam estar equipados com berçários e creches para crianças de até 7 anos. Apesar de acolher detentas, Tubarão não possui local adequado para abrigar recém-nascidos, fato que fez com que o juiz corregedor proibisse a presença de crianças. O bebê foi retirado do presídio pelo Conselho Tutelar e encaminhado à família da mãe.

Surpresa
O diretor do Departamento de Administração Prisional (Deap), Adércio Welter, disse ontem desconhecer a presença de um bebê dentro do presídio de Tubarão. Ele reforçou que todas as detentas com filhos recém-nascidos devem ficar em locais que mantêm berçários, como o Presídio Santa Augusta, em Criciúma, ou o Presídio Feminino de Florianópolis.

“As duas gestantes foram encaminhadas em fevereiro a Criciúma por determinação do Deap. Elas retornaram no mês passado para que os dois bebês fossem entregues à família. Não sabia que uma das crianças ainda estava lá”, argumentou o diretor do Deap. Ele esclarece que o departamento proíbe a permanência de crianças dentro do presídio de Tubarão. “Isso é um absurdo. Não permitimos jamais uma situação desta, pois o local não tem a menor condição de abrigar crianças”, ressaltou.

“Quero ficar com o meu filho”
Condenada por tráfico de drogas, a detenta mãe do bebê espera cumprir a pena para ficar com o filho em uma realidade bem diferente da atual. Quando deu à luz, chegou a ser encaminhada ao Presídio Santa Augusta, em fevereiro, em Criciúma, para aproveitar o berçário da ala feminina. Outra presa gestante também foi levada ao presídio de Criciúma.

Segundo o ex-diretor do presídio de Tubarão, Décio Paquelin, que estava à frente da unidade na época, quando as duas mães retornaram para Tubarão, uma delas teve que entregar o filho à família, uma vez que o bebê havia completado seis meses. “A outra mulher ficou com o neném até que ele pudesse ser levado para algum membro da família” explicou.

Quando retornou para Tubarão, no dia 9 do mês passado, o menino estava com quatro meses e passou a dividir a cela com a mãe, até a última sexta-feira. Sem ventilação adequada, o bebê, que ainda mama, dormia na mesma cama com a detenta. A mulher engravidou dentro do presídio, em uma das visitas íntimas que recebia do marido. “Quero sair daqui e ficar junto do meu filho. Não quero voltar para cá nunca mais”, almeja a mãe.


segunda-feira, 28 de março de 2011 às 06:37

O drama das internas do presídio feminino com filhos em abrigos públicos

Luana Maria Lima Sousa


Passado os seis meses do período de amamentação, internas do presídio feminino passam pelo drama da separação de seus bebês. A situação é ainda mais crítica quando
a criança tem que ir para um abrigo público.
A poucos metros da entrada principal do Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa (IPF), em Itaitinga, localiza-se a creche onde são abrigados os filhos das detentas nascidos no presídio. O local é arejado e bastante espaçoso. Durante seis meses, período de amamentação, as presidiárias permanecem em tempo integral na companhia dos filhos. São elas que brincam, acalentam, cuidam da higiene pessoal, da alimentação e colocam os bebês para dormir. Mas, passados os seis meses, a criança deve ir embora e a mãe voltar para uma cela do presídio, onde cumprirá o restante da pena.
De acordo com a ex-diretora do presídio, Izeuda Rocha Almeida, para as internas cuja família vai ficar com o bebê, o sofrimento é amenizado pela certeza de que serão bem cuidados.
Normalmente, é alguém de parentesco próximo, como uma avó ou uma irmã. Mas para aquelas que são estrangeiras, de outro Estado ou que os familiares não têm condições financeiras de criar a criança, só resta a opção de mandar o bebê para um abrigo público.
Nesses casos, a interna passa por toda uma preparação. Visita um psicólogo com bastante antecedência, para se preparar para o momento. “Ainda assim, a hora da separação é muito dolorosa. Elas passam o dia chorando, orando, é realmente muito forte. Eu já levei duas e saí com o coração partido. Tem que ser dura, se não a gente não leva. Na hora a criança chora, porque vê a mãe nervosa, naquela ansiedade e a mãe também se desestabiliza”, contou Izeuda.
Cinco filhos de internas encontram-se hoje em abrigos públicos: o Orfanato Casa de Jeremias, com crianças de 0 a 3 anos; a Creche Abrigo Tia Júlia, com crianças de 0 a 7 anos de idade; e o Santa Gianna Beretta Molla, que abriga crianças na faixa etária de 9 a 12 anos. Segundo Izeuda, uma vez por mês, as crianças são recolhidas dos abrigos e encaminhadas ao presídio para passar o dia com a mãe. “Para eles não perderem o vínculo”, explicou. As crianças que ficam com familiares podem visitar as mães nos dias de visita social, no último domingo de cada mês.
Ex-viciada em crack, Maria do Carmo da Silva, 33 anos, contou que foi parar no Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa (IPF) após infringir o artigo 157 do Código Penal Brasileiro, referente a latrocínio. Os dois filhos, ainda crianças, tiveram que ficar sob os cuidados de sua mãe. Mas, como os afazeres lhe tomavam muito tempo e as condições financeiras eram ruins, a avó não teve condições de sustentar os dois meninos e eles tiveram que ir para um abrigo público. Os filhos, de 11 e 13 anos, vivem no abrigo Santa Gianna e visitam a mãe no presídio uma vez por mês. 
Durante esta entrevista, quando o assunto foi os filhos, Maria do Carmo não conteve as lágrimas. “Sinto muita saudade deles. É muito ruim para uma mãe não poder acompanhar o desenvolvimento dos filhos. Me arrependo muito por ter me envolvido com pessoas erradas. Lá fora quero ser outra pessoa. Não pretendo repetir isso. Agradeço muito a Deus por ter dois filhos maravilhosos. Eles são inteligentes, cantam música de rap, de reggae, me orgulho muito deles. Quando eu estiver lá fora quero dar uma nova vida a eles”, desabafou.
Ao lado da igreja de Fátima, numa casa grande e aconchegante, os dois filhos de Maria do Carmo vivem com mais 25 crianças. São meninos e meninas na faixa etária de 6 a 12 anos. O mais velho, apesar de já estar com 13, permanece na casa por causa do irmão. “Para manutenção de vínculo”, como explicou Cláudia Maria, coordenadora geral do abrigo.
Cláudia Maria enfatizou que as visitas são muito difíceis para eles. “Quando retornam, vêm muito abalados. Sentam na cama e passam até duas horas de cabeça baixa. Não conversam, chegam muito abatidos, a gente nota que a visita mexe muito com eles”.
A coordenadora disse ainda, que os dois têm um comportamento muito ríspido no abrigo. “O mais velho tem agido de forma agressiva e o mais novo tem tido muita dificuldade na escola. Ele vai três dias para a aula e passa três suspenso. Já o encaminhamos para acompanhamento psicológico e psiquiátrico. Estavam suspeitando que ele estivesse com depressão, pela agressividade, falta de interesse e vários tipos de comportamento dele na casa. O menino, inclusive, passou uns dias sem ir para escola a pedido do médico, até para despertar nele o interesse de retornar à aula. Ele disse que queria voltar, mas essa semana, depois da visita, piorou”. Apesar disso, a coordenadora ressaltou que as visitas são muito importantes. “Eles precisam ir, porque sentem falta da mãe. Querem saber como ela está”, disse.
O abrigo existe há dois anos e surgiu de uma parceria entre o Shalom e o Governo do Estado. As crianças são encaminhadas pelo Juizado da Infância e da Juventude, Conselho Tutelar, Núcleo de Enfrentamento à Violência contra Crianças e Adolescentes ou vieram de outros abrigos. Todas estudam em escolas próximas. A fonte de financiamento vem de um convênio com o Governo, além de doações da Associação Shalom e da comunidade.
O acompanhamento emocional das crianças fica sob a responsabilidade de uma psicóloga, uma psicopedagoga e uma assistente social. Além destes profissionais, os que necessitam de maior atenção são encaminhados ao Núcleo de Atendimento Pedagógico Especializado (Nape). “Os que têm dificuldade de aprendizagem recebem reforço no próprio Nape, enquanto os que têm necessidade de atenção psicológica, recebem tratamento na Universidade de Fortaleza (Unifor) ou no Centro de Apoio Psicossocial (Caps), da Prefeitura de Fortaleza”.
O drama de uma interna de Porto Velho, que vive longe da família e da filha - Situação delicada é a de Rita Moura Pereira, 23 anos, natural de Porto Velho, que cumpre pena no IPF por tráfico de drogas. Com cerca de 15 anos ela saiu de casa, por causa do padrasto, e se envolveu com um homem com quem teve seu primeiro filho. Depois de sete anos ele faleceu, deixando-a numa situação complicada.
Sem emprego e sem estudos, Rita começou a se envolver com o seu segundo parceiro, de quem engravidou, e com “coisas fáceis, com drogas”. A essa altura, fez as pazes com a mãe, com quem foi embora para Goiânia, grávida de três meses. Começou, então, a levar uma vida diferente. Fez um curso de cabeleireira e planejava terminar os estudos quando tivesse o filho.
Tudo corria bem quando, no sétimo mês de gravidez, por insistência do pai de sua filha, ela voltou para Porto Velho. Mesmo estando grávida, acabou se envolvendo novamente com o mundo do tráfico e, dessa vez, com gente perigosa. Tudo às escondidas do companheiro, para quem mentia constantemente. “Ele não podia saber, porque não aceitava”, disse. Rita conheceu novas amigas que tinham maridos traficantes, e lhe ofereceram o trabalho de traficar drogas para outros Estados e até países vizinhos. Numa “entrega” para Fortaleza, já grávida de nove meses, foi presa no aeroporto Pinto Martins.
Rita chegou ao presídio feminino no dia 4 de abril de 2007, no dia 5 foi para a maternidade e no dia 6 chegou à creche. Ela contou que após ser presa, os amigos traficantes não lhe deram nenhuma assistência. Até então, o pai de sua filha não sabia de nada. Quando tomou conhecimento que Rita estava presa no Ceará, ele praticou um assalto para arranjar dinheiro e vir buscar a filha, e acabou também sendo preso. “Eu sofri demais. Se não fosse minha mãe, me enviando o dinheiro da pensão que eu recebia do meu ex-marido, eu teria passado mais necessidade”, contou.
Por ser de outro Estado, ter bom comportamento, com uma filha e sem ninguém que a ajudasse, Rita recebeu muita ajuda da direção. “Tanto que me deixaram ficar com a minha filha na creche até os sete meses. Mas quando me deram a notícia de que ela ia embora, fiquei desesperada. Pedi a direção, pelo amor de Deus, que não tirasse ela dos meus braços naquele momento, porque ela ainda estava mamando, e pedi que me dessem mais um tempo. Fiquei com ela mais quase um mês. No dia que a tiraram de mim e a levaram da creche, parecia que tava acabando o mundo”, desabafou.
Em setembro deste ano a mãe de Rita vinha buscar a neta, mas três dias antes da viagem amanheceu morta. “Foi mais um momento difícil, passei a maior barra dentro da cadeia. Hoje vivo do jeito que posso, não recebo visita nem tenho ninguém aqui por mim. Então, fico sempre dependendo da administração. Se não fosse a minha boa conduta, eu jamais teria esse apoio da direção, eles não apóiam quem tem má conduta”, contou.
Hoje, com um ano e sete meses, a filha de Rita vive no Orfanato Casa de Jeremias. Como possui o número do telefone da casa, ela pode, juntamente com a assistente social, ligar e conversar diretamente com dona Lúcia, responsável pelo abrigo. “Sempre que posso vou à assistente social. Às vezes ela não quer ligar, então eu choro e insisto. Não agüento ficar muito tempo sem notícias dela. Converso com dona Lúcia e ela me explica como a minha filha está”, disse.
Em seus planos, Rita disse que primeiro quer pagar o que deve à justiça, para depois recuperar o tempo perdido. “Se eu tivesse antes a cabeça que tenho agora, nada disso teria acontecido. Hoje aprendi com o sofrimento. Então, se eu fizer de novo é porque eu gosto do mundo do crime, do tráfico. A pessoa que leva uma vida dessas na cadeia, se sair e fizer de novo, é porque ela gosta de viver assim. Isso é pra quem não tem sentimento, que não sofre. Aí dentro tem gente que não sofre. Vai e volta, vai e volta, vai e volta, não quero isso pra mim”, concluiu.
Para Diana Vanessa Pereira, assistente social do IPF, a creche é como se fosse o mundo da maternidade. “Quando os filhos vão para o abrigo, elas vão para dentro das alas, então o contato deles fica sendo praticamente uma vez ao mês com as visitas. Tem mulheres que não tiveram a oportunidade de cantar nem os parabéns do primeiro ano de vida dos seus filhos. Para elas isso é muito marcante”, disse.
De acordo com Diana, faz parte da rotina do serviço social levar as crianças dos abrigos para o presídio, pelo menos uma vez ao mês, para ver as mães, e acompanhar como está o estado emocional e em que situação elas se encontram. Mas, segundo ela, o interesse tem que partir principalmente das próprias mães. 
“A gente infelizmente tem um recurso humano de serviço social muito reduzido. Não temos aquela periodicidade de toda semana estar ligando, e nem um retorno da própria instituição para informar como está a evolução daquela criança. Então, geralmente, parte delas a iniciativa de chegar e perguntar como está o filho”, disse.
Diana contou que algumas mães são mais atentas, estão toda semana cobrando, perguntando pelo filho. Nesses casos, quase toda semana o serviço social tem condições de saber como a criança está. “Mas nem todas são assim. Estamos hoje com 268 internas e duas profissionais de serviço social para atender a todo esse universo. Então tem aquelas que a gente tem uma atenção maior por alguma vulnerabilidade social, como a gente chama, ou então por demanda delas mesmo”.
De acordo com o psicólogo Igor Melo de Souza, do abrigo Santa Gianna, quando a criança é encaminhada a familiares, não prejudica tanto na sua formação porque elas vivem em um ambiente familiar, onde podem ter uma segurança materna e paterna, não necessariamente da mãe e do pai, mas um avô, uma avó, um tio ou uma tia, que venha representar a figura materna e paterna na vida delas.
Mas quando a criança vai para um abrigo, por mais que hoje se tenha uma perspectiva de um abrigo menor, como é o caso do Santa Gianna, onde os funcionários não usam crachá, nem uniforme, na tentativa de criar um ambiente mais familiar, ainda assim elas acabam ficando sem o referencial do pai e da mãe.
Segundo o psicólogo, essa falta de referencial prejudica muito o crescimento da criança, tanto no aspecto afetivo e emocional, quanto no cognitivo, pois ela fica sem ter a quem imitar, sem uma pessoa que sirva de exemplo. “A mãe é a referência da criança, é ela quem passa segurança, quem conversa, quem vai estimular seu desenvolvimento, a quem a criança pode recorrer. Então a mãe tem esse papel primordial”.

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